domingo, 18 de abril de 2010

Democratização da Comunicação e Redes Digitais

Márcio Kerbel


Cidania e as Possibilidades Democráticas nas Redes Digitais

Em tempo de fragmentação do espaço público e esfacelamento dos ideais coletivos, a utilização da tecnologia da informação e particularmente o avanço da Internet contribuíram para a criação de canais que se constituíram em mecanismos de luta pela democratização da comunicação.

A realização da I Conferência Nacional de Comunicação é um exemplo de bom aproveitamento dos dispositivos digitais pelas organizações da sociedade: blogs, sites e redes sociais promoveram a discussão e a mobilização de milhares de pessoas em todo o país.

Em cada etapa regional, na mobilização dos municípios era comum a criação de blogs e redes sociais. Sites de relacionamento como Orkut e Facebook serviram de plataforma para articular e aproximar ativistas distribuídos em diferentes locais.

Em Niterói, além da tradicional lista de discussão, foi utilizado como canal de comunicação,o Ning, uma plataforma, até então gratuita que permitia a criação de redes sociais, o dispositivo serviu para promover maior interação entre os militantes do Movimento Pró-Conferência de Comunicação.

A Internet, que tem sua origem nos interesses militares norte-americanos se reconfigura pela intervenção direta de seus usuários (acadêmicos, hackers e programadores, inspirados na contracultura dos anos 60) e se transforma em poderosa ferramenta de comunicação capaz de conferir aos indivíduos um poder de intervenção jamais imaginado.

Para os movimentos sociais o uso da rede mundial de computadores significou um avanço, a experiência no combate ao autoritarismo no Brasil dos anos 70 e 80 através de instituições como sindicatos, partidos e associações, atestam a importância da organização em rede, que transplantada para a Internet dinamiza as comunicações e elimina restrições de espaço e tempo .

A veiculação de informação no Brasil obedece à lógica dos interesses dos grupos empresariais que controlam os meios de comunicação de massa. A concentração dos meios eletrônicos nas mãos de um reduzido grupo de pessoas põe em cheque o conceito de imparcialidade e da objetividade jornalística.

A disputa pelo mercado não distancia estes grupos do objetivo comum de garantir a preservação de espaços de poder que asseguram, por exemplo, a manutenção além do prazo de concessões de rádio e televisão.

O consenso dos grupos econômicoscontraria os ditames de um estado democrático. Segundo Venício A.de Lima "A Condição básica para a realização dos direitos políticos da cidadania

no mundo contemporâneo é a existência de uma mídia democratizada, portanto, "do ponto de vista da ordenação jurídico-formal, existe uma relação constitutiva entre a comunicação, o poder e a cidadania.(Venício,2006).

Da confluência de interesses do capital e favorecidos pelo desenvolvimento tecnológico surge a mídia para exercer forte influência no espaço público. Mauro Wolf observa que a "mídia é um... terreno de confronto político, um sistema de intervenção cultural e de agregação social e um entretenimento".

Neste complexo industrial, após a supremacia dos meios eletrônicos de massa (rádio e televisão) tem início um processo de inovações, as TCIs_ tecnologias de comunicação e informação promovem alterações na relação entre produtores e receptores de conteúdo.

A convergência digital dissolve as fronteiras entre a televisão, o telefone e o computador, no campo econômico grandes corporações incorporam os avanços tecnológicos e consolidam uma estratégia global de concentração no setor.

No Brasil, sem a definição de um marco regulatório, é permitida a propriedade cruzada dos meios de comunicação, empresas como Globo, bandeirantes e Abril controlam jornais,redes de rádio e televisão. Como afirma Venício “É dentro desse contexto midiático que se realizam as relações entre poder e cidadania no Brasil”.

A concentração dos meios de comunicação produz distorções que afetam o poder político e a própria idéia de democracia, definida por Bobbio como "governo de poder visível" ou como governo de poder público em público.

Em síntese, portanto, a democracia como regime do poder visível da coisa pública tem na visibilidade proporcionada pela mídia uma importante ferramenta. A idéia de "evento público" se transforma, deslocando do espaço comum, da necessidade da presencialidade para o conceito de compartilhamento, não importando a distância no tempo e no espaço.

A esfera pública mediada pela imprensa transforma a atividade política em um campo minado, a reputação, aspecto do capital simbólico de um agente político, corre sério risco como atesta o deputado José Eduardo Cardoso (PT-SP): “Hoje um político sério no Brasil pode vir a ser punido ou mesmo correr o risco de perder o seu mandato, por um mero descuido ou erro formal. Será então exposto à impiedosa execração pública que o tratará como um criminoso de alta periculosidade, com seu nome e fotografia estampado pelos órgãos de comunicação, sem que se busque saber, exatamente qual “delito”, de fato, ele cometeu”.

A mídia julga e ao mesmo tempo condena como no caso da Escola Base ou na estigmatização dos agentes políticos como nos casos do mensalão e dos aloprados. Essa autoridade exercida sob o manto da imparcialidade começa a sofrer algum desgaste com o fortalecimento das redes sociais, a comunicação mediada pelo computador confere um poder inimaginável ao usuário que interage recebendo e produzindo conteúdo.



Bibliografia e referências:


SILVEIRA, Sergio Amadeu. Novas dimensões da política: protocolos e códigos na esfera pública interconectada. Rev. Sociol. Polit. vol.17 no.34 Curitiba Oct. 2009. http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-44782009000300008&script=sci_a...



LIMA, Venício A. Comunicação, poder e cidadania. Rastros - Revista do Núcleo de Estudos de Comunicação.

http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/rastros/article/download...

2 comentários:

Raquel disse...

Creio que muita coisa que temos hoje na web não seja lá tão revolucionária quanto pensamos. Conseguimos encontrar raízes, vestígios involuntários (Se formos pensar do presente pro passado) de vários ambientes online no nosso passado. Por exemplo, poderíamos ver o twitter como um parente do telégrafo, etc.


Mas é lógico que a web traz diferenciais gritantes para esse contexto, uma vez que a potencialidade de tudo ali é maior e determinante!

abs
Raquel

Raphael Rap disse...

Márcio, você levantou uma questão interessante relacionada à comunicação nas redes. Usualmente a mídia de massa trata o suposto suspeito como um condenado potencial.

Penso que as redes digitais podem tornar esse prévio julgamento mais transparente.

Cito o caso da divulgação de senadores "ficha suja" - http://caranovanocongresso.blogspot.com/2010/04/lista-dos-senadores-com-ocorrencias-na_19.html com informações retiradas do Projeto Excelências - http://www.excelencias.org.br

O fato é que condenados, investigados e os representados estão em pé de igualdade. Como podemos falar de consciência nas ações se não pudermos sequer diferenciar um culpado de um inocente (até que se prove o contrário). Infelizmente nas redes sociais essa ainda é, uma faca de dois gumes

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